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- Artigo: Previdência Privada é parte da solução para desafios sociais, demográficos e econômicos do Brasil

- 19/08/2024
- Estevão Scripilliti é diretor da Bradesco Vida e Previdência
Artigo: Previdência Privada é parte da solução para desafios sociais, demográficos e econômicos do Brasil
Desde que foi regulamentada, em 1977, a previdência privada vem se desenvolvendo e se remodelando para se ajustar às necessidades econômicas, financeiras e demográficas da sociedade brasileira, que vão se alternando no tempo. Os desafios do presente e do futuro passam por:
- Insuficiência da previdência pública como provedora dos recursos necessários para a segurança da maior parte da população brasileira, dada a necessidade de equilíbrio atuarial do sistema de repartição em um ambiente de transição demográfica acelerada, rumo a uma sociedade com menos jovens e maior contingente populacional com longevidade ampliada;
- Alto nível de endividamento público, sem perspectiva de alívio e inversão da curva da dívida/PIB, o que demandará mais e mais recursos para financiar essa dívida ao longo do tempo. As carências sociais, provavelmente, demandarão dispêndios públicos elevados por longo tempo e, como os níveis de tributação já são elevados para os padrões globais, há um espaço limitado para ajustes adicionais via aumento de arrecadação;
- Novas estruturas produtivas, com maior incerteza, necessidade de maior flexibilidade nas relações trabalhistas e peso crescente do empreendedorismo e das pequenas e médias empresas como empregadoras;
- Transições intergeracionais futuras, que, pela primeira vez em muitas décadas, podem resultar em padrões de renda decrescentes para as novas gerações em relação às precedentes, trazendo novos pontos de atenção (e de eventual tensão) sociais e econômicos nas transições para as próximas gerações.
Para todos esses desafios, a previdência privada é parte integrante da solução. E, para que seja ainda mais bem aproveitada e alavancada como instrumento mitigador dos riscos econômicos e sociais do futuro, é importante que seja bem tratada por nossos legisladores, reguladores, julgadores e pelos próprios agentes atuantes nesse mercado, recebendo os estímulos adequados ao seu fomento.
Vejamos como a previdência privada pode contribuir para enfrentarmos cada um desses quatro pontos:
Insuficiência da previdência pública
Não é novidade para ninguém que a previdência pública tem sido um desafio no Brasil, demandando sucessivas reformas ao longo das últimas três décadas para readequação das condições de elegibilidade e redução dos valores dos benefícios concedidos. Há uma busca permanente por reenquadramento atuarial e redução dos desequilíbrios futuros quanto à capacidade de arrecadação do sistema com os contribuintes em atividade que financiam o conjunto de todo os benefícios previdenciários já concedidos: aposentadoria de titular e dependentes, pensões, coberturas complementares por invalidez e benefício de prestação continuada, mesmo para pessoas que nunca contribuíram para o sistema, mas que têm condição de vulnerabilidade social, entre outras coberturas previstas.
Foram nada menos do que sete grandes reformas legislativas sobre o tema realizadas desde 1994, o que dá a dimensão do desafio de readequação do sistema público. Apesar de todos os esforços, porém, as projeções continuam a apontar para nova deterioração dos déficits previdenciários. A relação entre o número de contribuintes e de beneficiários do sistema, hoje em torno de 6 para 1, deve cair para menos de 3 para 1 em menos de 20 anos, o que demonstra o tamanho do ajuste a ser feito no futuro próximo. Confirmadas essas projeções, é de se esperar que o valor das aposentadorias públicas seja cada vez menor, caminhando para um benefício de renda mínima de subsistência a médio prazo. Com isso, será cada vez mais necessária a complementação de recursos via previdência privada, para assegurar uma condição financeira menos desfavorável a uma parcela crescente da população brasileira.
Alto nível de endividamento público
A dívida pública se aproxima de 80% do PIB, nível considerado alto para os padrões históricos de países emergentes. Mais do que isso, as perspectivas para os próximos anos não são de queda, nem tampouco de estabilização da relação dívida/PIB, o que sinaliza que essa condição continuará a representar um risco econômico e social adiante. As carências e, por consequência, as demandas sociais, com garantias mínimas constitucionais em vários setores, mantêm os gastos públicos pressionados. Ao mesmo tempo, a carga tributária já alcançou níveis considerados elevados para a estrutura produtiva e o grau de formalização da nossa economia. Esta equação implica escolhas cada vez mais difíceis e sensíveis, para evitar uma deterioração adicional da dívida pública. Para quem devem ser destinados os recursos públicos? Quais são os serviços prioritários, a escala de gasto, a estrutura pública (física e de recursos humanos) e a governança necessárias para mantê-los? Na prática, o que temos visto é uma enorme dificuldade de enfrentarmos reformas mais ambiciosas nas estruturas de gastos públicos do país, ano após ano, governo após governo.
Se estiver certo na premissa de que vamos ter que conviver com uma dívida pública elevada e eventualmente crescente no tempo, será cada vez mais necessário buscarmos fontes de financiamento em larga escala comprometidas em carregar títulos públicos por longos períodos de tempo, reduzindo os riscos de rolagens de dívidas massivas de curto prazo, e denominados em moeda local, de forma a mitigar, também, o risco de contaminação entre movimentos cambiais e uma dinâmica de dívida mais crítica, como já vivenciamos no passado, embora partindo de níveis de dívida/PIB bem inferiores aos atuais.
Aqui, uma vez mais, a previdência privada pode cumprir um importante papel como instrumento de financiamento parcial da nossa dívida, com regras bem definidas para estimular e premiar a manutenção de recursos por prazos longos, seja com mecanismos de redução de alíquota de impostos conforme o tempo de acumulação cresce - podendo, por que não, chegar à isenção de impostos para quem acumular recursos por prazos desejáveis pelo governo (superiores a 20 ou 30 anos, por exemplo) -, seja com regras de vesting (que consideram o prazo de acumulação para acessar percentual maior de recursos depositados por empresas em planos de previdencia privada de seus funcionários).
Hoje, os recursos de previdência privada, entre planos individuais, empresarias e fundos de pensão, giram ao redor de R$ 2,7 trilhões, representando cerca de 25% do PIB. Destinam-se, majoritariamente, ao financiamento da dívida pública, mas também servem como funding para dívidas privadas que financiam as atividades produtivas de empresas que criam milhões de empregos, além de participações acionárias que geram capital para que empresas com acesso a esses recursos acelerem seus planos de negócios e contribuam para uma economia mais dinâmica, em benefício de todos.
Atualmente, há cerca de 15 milhões de titulares de planos de previdência privada, dentro do universo de aproximadamente 100 milhões de pessoas que compõem a população economicamente ativa do país. Esses números demonstram a necessidade de avançarmos nas regras e incentivos capazes de estimular a adesão a um instrumento tão importante para ampliar a proteção e o planejamento financeiro futuro da nossa população nas décadas desafiadoras que virão.
Peso crescente das pequenas e médias empresas na geração de empregos
O peso relativo das pequenas e médias empresas aumentou nas últimas décadas. Esse espírito empreendedor crescente é muito interessante, mas coloca o desafio de se reverem algumas leis e normas que foram pensadas e concebidas para estruturas produtivas centradas nas grandes empresas. Isto vale, por exemplo, para as deduções previstas nos impostos de pessoas jurídicas, que contemplam as contribuições de empresas para a previdência privada de seus funcionários, mas somente daquelas que declaram seu IR no regime de lucro real, realidade mais vinculada às empresas de maior porte.
É fundamental, portanto, que haja uma modernização mais ampla das leis e normas que regem os incentivos para as empresas adotarem e estimularem seus funcionários a aderir aos planos de previdência privada corporativos, de forma a ampliar essa fonte de formação de poupança no país, provendo um crescente volume de financiamento de longo prazo para atividades produtivas e para a própria dívida pública.
O tempo é agora para redesenhar esses incentivos, de modo que se possa, de fato, ampliar a formação da poupança dos funcionários dos mais diversos tipos e tamanhos de empresas, aumentando seu colchão de proteção financeira de médio e longo prazos, principalmente em um ambiente de mercado de trabalho mais instável e imprevisível, dadas as transformações econômicas e tecnológicas cada vez mais intensas que vivenciamos.
O desafio da proteção e do planejamento intergeracional em um ambiente novo, de eventual decréscimo da renda para as novas gerações
Após décadas de ascensão contínua de renda, gerações após gerações, há sinais de alerta de que essa dinâmica pode não se reproduzir nas próximas gerações. Dentre eles, destacam-se condições demográficas menos favoráveis; redução das taxas de natalidade e, por consequência, disponibilidade de mão de obra mais restrita; e maiores limitações do ponto de vista ambiental para exploração de alguns recursos naturais, além de evidências de que novos grandes saltos de produtividade podem ser mais difíceis de alcançar, dados o nível de competitividade já atingido em diversos setores e os ambientes geopolítico e regulatório mais apertados do que nas décadas anteriores, marcadas por amplas aberturas econômicas e comerciais.
Neste sentido, será cada vez mais importante refletir sobre os mecanismos de construção e de transição geracional de renda e riqueza, de forma a suavizar o máximo possível os eventuais impactos dessa estabilização ou até declínio na capacidade de gerar riqueza das novas gerações. Sabemos que os ambientes onde há essa maior restrição na capacidade de gerar riqueza são férteis para a proliferação de instabilidade social, processo indesejável para qualquer país. Portanto, devemos começar a pensar, desde já, não apenas em estimular uma maior poupança individual das atuais gerações, mas também em criar instrumentos mais efetivos para prover a construção e transmissão de uma maior poupança entre gerações, de forma a ampliar a quantidade de famílias brasileiras capazes de transmitir riqueza e fluxo de renda saudáveis para seus filhos e netos, mitigando, assim, os riscos de tensionamentos sociais maiores adiante.
Por todos os motivos elencados, é altamente desejável que os incentivos à formação da previdência privada continuem a ser aprimorados, seja do ponto de vista dos benefícios para acumulação nos planos individuias, seja por meio de incentivos à maior adesão de empresas e empregados aos planos corporativos de companhias dos mais diversos portes, ou ainda dos próprios fundos de pensão. E, cada vez mais, deve estar na agenda não apenas a construção de um ambiente favorável à acumulação saudável de recursos para aposentadoria das gerações atuais, mas também os mecanismos para que as reservas possam ser repassadas para as futuras gerações de forma eficiente, como forma de mitigar os riscos futuros de fragilidades econômico sociais do país.
É tempo de voltarmos a pensar mais em como endereçar o futuro do nosso país de forma estruturante, intergeracional e criteriosa, com avaliações de impacto de longo prazo de cada medida adotada, e menos em simplesmente “tapar o buraco” de curtíssimo prazo, com uma ânsia arrecadatória que, muitas vezes, gera mais prejuízos de médio prazo do que soluciona as nossas fragilidades fiscais de maneira consistente.
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